O exército troiano, batido por Aquiles em todas as frentes, fugia para as margens da vertiginosa corrente do rio Xanto, o sagrado rio que provinha do Olimpo. Refaziam agora, em sentido contrário, o mesmo caminho por onde haviam passado, vitoriosos, conduzidos por Heitor. Para confundi-los ainda mais, Juno fez baixar do céu um espesso nevoeiro, que não lhes permitia ver bem o caminho da fuga.
Acometidos de pavor, homens, cavalos e carros despenhavam-se no turbilhão das águas do rio. Os que não sabiam nadar logo morreram, mas os outros ainda ficaram a debater-se na correnteza. Sobre estes, caiu Aquiles qual demónio com a espada flamejante desembainhada. Dentro de poucos momentos os corpos bolavam na superfície e as águas avermelhavam-se com o sangue dos guerreiros. Eram como um cardume de peixes miúdos perseguidos por um delfim gigantesco. Procuravam ocultar-se nas furnas e fendas das rochas, mas lá os ia abater Aquiles, sedento de vingança.
Quando começou a sentir-se cansado de matar, o guerreiro arrastou para fora do rio doze dos mais jovens guerreiros troianos, atou-lhes as mãos atrás das costas e entregou-os a companheiros de confiança para que os levassem aos navios. Ali deveriam pagar com as suas vidas a morte de Pátrodo. Feito isto, voltou mais uma vez ao rio. Um dos filhos de Priamo, Licáon, achava-se perto da margem, sem lança nem capacete, lutando para se livrar da impetuosa torrente. Tempos atrás, Aquiles tinha-o derrotado e feito prisioneiro. Vendera-o como escravo, mas um amigo de Príamo resgatara-o e ele pudera voltar a Tróia, onde se encontrava apenas há doze dias. Por isso, ao vê-lo agora a surgir das profundezas do rio, Aquiles ficou surpreendido pois não soubera do resgate. Dirigiu-lhe então estas palavras irónicas:
— Oh! Grande milagre vêem os meus olhos! Um dos troianos a quem aprisionei é-me devolvido pelas águas do Xanto! Mas, se escapaste ao cativeiro, não te livrarás agora da ponta da minha lança!