CAPÍTULO 8 No dia seguinte, por volta das onze horas e meia da noite, a herdade do Capitão estava imersa no mais fundo silêncio.
E, a não ser o reflexo de uma luz que brilhava nas vidraças de um dos quartos do lado norte, dir-se-ia que tudo ali repousava.
A janela que assim resplandecia no meio das densas trevas que cercavam o resto da casa era a do quarto de Fernando, e o vulto deste, destacando-se de vez em quando no meio da claridade, denotava que o jovem ainda se não havia deitado.
Penetremos no quarto.
Algumas cadeiras antigas, um leito de pau-preto da mesma idade dos outros móveis, uma meia-cómoda com toucador, duas pequenas mesas, sobre uma das quais se via um relógio, uma outra colocada no meio do aposento, cheia de livros em desordem, eis a decoração singela daquele quarto, não mencionando dois ou três cabides pregados na parede, vergando sob o peso de alguma roupa.
Fernando, que havia algum tempo passeava de um para o outro lado do aposento, sentara-se afinal junto da mesa dos livros, e, pegando num deles, abriu-o ao acaso e permaneceu algum tempo com os olhos fitos nas duas páginas que tinha diante de si, parecendo ler. De vez em quando, porém, olhava com impaciência para os ponteiros do relógio e depois dir-se-ia continuar a leitura interrompida.
Estes movimentos contínuos, do relógio para as páginas do livro, repetiram-se por muitas vezes num curto espaço de tempo, até que, afinal, a campainha soou doze badaladas. Fernando, que parecia esperar com ansiedade aquela hora, estremeceu ao ouvir os primeiros sons, e, levantando-se precipitadamente, dirigiu-se a um cabide e tirou dele um capote, com o qual se cobriu, exclamando:
- Ora até que enfim! Parecia que não chegava hoje a meia-noite e que o Diabo se entretinha a reter os ponteiros!.