COMO TUDO ACONTECEU (How it happened) Ela era médium, especialista em escrita automática. Eis o que escreveu:
Consigo recordar-me de certas coisas sobre aquele serão, com muita precisão, ao passo que outras se assemelham a vagos sonhos interrompidos. Já não sei absolutamente nada acerca do motivo que me tinha levado a Londres de onde regressei muito tarde. Esta noite confunde-se com todas as minhas outras estadas em Londres. Mas a partir do momento em que me apeei na pequena gare de província, tudo fica prodigiosamente claro. Consigo reviver cada momento.
Recordo-me perfeitamente de ter andado ao longo do cais e de ter olhado para o relógio iluminado da gare: marcava onze e meia. Recordo-me também de que me perguntei se conseguiria chegar antes da meia-noite. E depois recordo-me da grande viatura, com os seus faróis ofuscantes e o brilho dos seus cobres, que me aguardava no exterior. Era a minha nova Robur de 30 cavalos, que me fora entregue nesse mesmo dia. Recordo-me ainda de ter perguntado a Perkins, o meu motorista, como ela se comportava e de tê-lo ouvido responder que era um carro muito bom.
- Vou experimentá-lo - declarei ao mesmo tempo que me instalava ao volante.
- As velocidades não são as mesmas - respondeu-me ele. - Talvez fosse melhor, senhor, que eu o conduzisse... - Não. Sinto realmente vontade de experimentar.
E partimos para percorrer os oito quilómetros que nos separavam de casa.
A minha antiga viatura tinha os carretos fixados em rodas dentadas assentes numa barra. Pelo contrário, nesta nova a alavanca passava através de uma grelha para mudar de velocidade. Não era difícil e em breve julguei ter dominado o mecanismo. Era absurdo, claro, querer familiarizar-me com um novo método durante a noite, mas cometem-se muitas vezes disparates sem sermos muito penalizados por isso.