Tenho uma dívida de lealdade para com o patrão, como o senhor bem sabe. Além disso, tenho de olhar pelos meus pais e pela minha irmã. Estou a passar por uma situação difícil, mas acabarei vencendo.
»Não me torne as coisas mais complicadas do que elas já são. Eu bem sei que os caixeiros-viajantes não são muito bem vistos no escritório. As pessoas pensam que eles levam uma vida estupenda e ganham rios de dinheiro. Trata-se de um preconceito que nenhuma razão especial leva a reconsiderar. Mas o senhor vê as coisas profissionais de uma maneira mais compreensiva do que o resto do pessoal, isso vê, aqui para nós, deixe que lhe diga, mais compreensiva do que o próprio patrão, que, sendo o proprietário, facilmente se deixa influenciar contra qualquer dos empregados. E o senhor bem sabe que o caixeiro-viajante, que durante todo o ano raramente está no escritório, é muitas vezes vítima de injustiças, do azar e de queixas injustificadas, das quais normalmente nada sabe, a não ser quando regressa, exausto das suas deslocações, e só nessa altura sofre pessoalmente as suas funestas consequências; para elas, não consegue descobrir as causas originais. Peço-lhe, por favor, que não se vá embora sem uma palavra sequer que mostre que me dá razão, pelo menos em parte!
Logo às primeiras palavras de Gregório, o chefe de escritório recuara e limitava-se a fitá-lo embasbacado, retorcendo os lábios, por cima do ombro crispado.
Enquanto Gregório falava, não estivera um momento quieto, procurando, sem tirar os olhos de Gregório, esgueirar-se para a porta, centímetro a centímetro, como se obedecesse a qualquer ordem secreta para abandonar a sala. Estava junto ao vestíbulo, e a maneira súbita como deu um último passo para sair da sala de estar levaria a crer que tinha posto o pé em cima duma brasa.