A Metamorfose - Cap. 3: Capítulo III Pág. 55 / 66

que inicialmente tinham permanecido de pé, com as mãos nos bolsos, quase em cima da estante de música, de tal maneira que por pouco poderiam ler também as notas, o que devia ter perturbado a irmã, tinham se logo afastado para junto da janela, onde sussurravam de cabeça baixa, e ali permaneceram até que o Senhor Samsa começou a fitá-los ansiosamente. Efetivamente, era por de mais evidente que tinham sido desapontadas as suas esperanças de ouvirem uma execução de qualidade ou com interesse, que estavam saturados da audição e apenas continuavam a permitir que ela lhes perturbasse o sossego por mera questão de cortesia. Adivinhava-se-lhes a irritação pela maneira como sopravam o fumo dos charutos para o ar, pela boca e pelo nariz. Grete estava a tocar tão bem! Tinha o rosto inclinado para o instrumento e os olhos tristes seguiam atentamente a partitura. Gregório arrastou-se um pouco mais para diante e baixou a cabeça para o chão, a fim de poder encontrar o olhar da irmã. Poderia ser realmente um animal, quando a música tinha sobre si tal efeito?

Parecia abrir diante de si o caminho para o alimento desconhecido que tanto desejava. Estava decidido a continuar o avanço até chegar ao pé da irmã e puxar-lhe pela saia, para dar-lhe a perceber que devia ir tocar para o quarto dele, visto que ali ninguém como ele apreciava a sua música. Nunca a deixaria sair do seu quarto, pelo menos enquanto vivesse. Pela primeira vez, o aspecto repulsivo seria de utilidade: poderia vigiar imediatamente todas as portas do quarto e cuspir a qualquer intruso. A irmã não precisava de sentir-se forçada, porque ficaria à vontade com ele.

Sentaria no sofá junto dele e inclinaria para confiar-lhe que estava na firme disposição de matriculá-la no Conservatório





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