Foi por estar constantemente a oferecer um milhão ao governador, se o pusesse em liberdade, que o cérebro do abade que esteve nesta cela antes do senhor se avariou.
- E há quanto tempo deixou esta cela? - Dois anos.
- Puseram-no em liberdade? - Não, meteram-no numa masmorra.
- Escuta - disse Dantès. - Não sou um abade nem sou um louco. Talvez o venha a ser, mas infelizmente, neste momento, ainda estou em meu perfeito juízo. Vou fazer-te outra proposta.
- Qual?
- Não te oferecerei um milhão, porque não to poderia dar; mas oferecer-te-ei cem escudos se quiseres, na primeira vez que fores a Marselha, descer até aos Catalães e entregar uma carta a uma rapariga chamada Mercédès. Nem sequer uma carta, apenas duas linhas.
- Se levasse essas duas linhas e fosse descoberto, perderia o meu lugar, que é de mil libras por ano, sem contar com os extraordinários e com a alimentação. Como vê, seria um grande imbecil se me arriscasse a perder mil libras para ganhar trezentas.
- Nesse caso, escuta e toma bem nota disto - disse Dantès. - Se recusas levar duas linhas a Mercédès ou pelo menos preveni-la de que estou aqui, um dia esperar-te-ei escondido atrás da minha porta e quando fores a entrar quebrar-te-ei a cabeça com este banco.
- Ameaças!... - exclamou o carcereiro, dando um passo atrás e pondo-se na defensiva. - Decididamente, não está bom da cabeça.
O abade começou como o senhor e dentro de três dias o senhor estará doido varrido como ele. Felizmente não faltam masmorras no Castelo de If.
Dantès pegou no banco e fê-lo girar à volta da cabeça.
- Está bem, está bem! - disse o carcereiro. - Pronto, uma vez que insiste, vou prevenir o governador.
- Depressa! - redarguiu Dantès, voltando a pousar o banco no chão e sentando-se nele, de cabeça baixa e olhos esgazeados, como se realmente tivesse enlouquecido.
O carcereiro saiu e regressou pouco depois com quatro soldados e um cabo.
- Por ordem do governador - disse -, desçam o prisioneiro para o andar por baixo deste.
- Para as masmorras, então - observou o cabo.
- Sim, para as masmorras. Devem pôr-se os loucos ao pé dos loucos.
Os quatro soldados agarraram Dantès, que caiu numa espécie de atonia e os acompanhou sem resistência.
Fizeram-no descer quinze degraus e abriram a porta de uma masmorra na qual entrou murmurando:
- Tem razão, devem pôr-se os loucos ao pé dos loucos.
A porta voltou a fechar-se e Dantès caminhou em frente com as mãos estendidas até tocar na parede. Então, sentou-se num canto e ficou imóvel, enquanto os seus olhos se habituavam pouco a pouco à obscuridade e começavam a distinguir os objetos.
O carcereiro tinha razão: faltava muito pouco para que Dantès enlouquecesse.