Dom Bibas não era bobo; era o diabo. Logo veremos porquê. Convidámos o leitor para escutar a conversação travada entre Gonçalo Mendes, o abade beneditino e o mui reverendo cónego de Lamego, Martim Eicha. Pode ouvi-los agora. Embebidos no seu grave disputar, todos três se esqueceram completamente do lugar onde estavam, e do sarau, que depois do doudejar vívido e alegre ao redor deles esmorecia já e esfriava em paroxismo final. A noite correra sem que de tal dessem tino. Sobre o tumultuar dos passos, sobre o ruído do falar confuso, sobre as toadas dos instrumentos que afrouxam, ouve-se primeiro o vozear retumbante do Lidador; depois as palavras flautadas, escandidas, melifluamente hipócritas do capelão da infanta; e por último as falas brandas, tardas e suaves do beneditino. Esta gradação corresponde ao progresso de silêncio que principia a predominar na sala: é a medida do tédio que leva de vencida o deleite naquele ajuntamento lustroso. – ... Eis aí – dizia o Lidador voltando-se para Martim Eicha – o que eu havia previsto; eis aí o resultado final do desenfreado orgulho do senhor de Trava, e dessa desgraçada afeição da rainha. Depois do folgar pacífico em jogos de tavolado e saraus oferecem- -nos uma festa de sangue. – Mas quem sabe se essas novas são verdadeiras? – interrompeu o abade, que parecia olhar duvidoso para o honrado cónego de Lamego.