ÀS dez horas e meia da noite daquele dia, três vultos convergiram para o local, raro frequentado, em que se abria a porta do quintal de Tadeu de Albuquerque. Ali se detiveram alguns minutos discutindo e gesticulando. Dos três vultos havia um, cujas palavras eram ouvidas em silêncio e sem réplica pelos outros. Dizia ele a um dos dois:
– Não convém que estejas perto desta porta. Se o homem aparecesse aqui morto, as suspeitas caíam logo sobre mim ou meu tio. Afastem-se vocês um do outro, e tenham o ouvido aplicado ao tropel do cavalo. Depois apressem o passo até o encontrarem, de modo que os tiros sejam dados longe daqui.
– Mas… – atalhou um – quem nos diz que ele veio ontem a cavalo, e hoje vem a pé?
– É verdade! – acrescentou o outro.
– Se ele vier a pé, eu lhes darei aviso para o seguirem depois até o terem a jeito de tiro, mas longe daqui, percebem vocês? – disse Baltasar Coutinho.
– Sim, senhor; mas se ele sai de casa do pai, e entra sem nos dar tempo?
– Tenho a certeza de que não está em casa do pai, já lho disse. Basta de palavreado. Vão esconder-se atrás da igreja, e não adormeçam.
Debandou o grupo, e Baltasar ficou alguns momentos encostado ao muro. Soaram os três quartos depois das dez. O de Castro Daire colocou o ouvido à porta, e retirou-se aceleradamente, ouvindo o rumor da folhagem seca que Teresa vinha pisando.
Apenas Baltasar, cosido com o muro, desaparecera, um vulto assomou do outro lado a passo rápido. Não parou: foi direito a todos os pontos onde uma sombra podia figurar um homem. Rodeou a igreja que estava a duzentos passos de distância. Viu os dois vultos direitos com o recanto que formava a junção da capela-mor, e sobre
o qual caíam as sombras da torre. Fitou-os de passagem, e suspeitou; não os conheceu, mas eles disseram entre si, depois que ele desaparecera:
– É o João da Cruz, ferrador, ou o diabo por ele!…
– Que fará a esta hora por aqui?!
– Eu sei!
– Não desconfias que ele entre nisto?
– Agora! Se entrasse, era por nós. Não sabes que ele foi mochila do nosso amo?