CAPÍTULO XXIV - A NETA DO ABADE DE ESPINHO Primeiro enleio da viscondessa: a mãe de Alexandre Pimentel era uma senhora ainda bela, sem impedimento de alguns cabelos alvejantes, não raros, aos 30 anos. Ricardina tinha 40. Era a formosura inflexível ao dilacerar da desgraça. A expectativa de Matilde figurava-lhe uma velhinha, carcomida da traça dos 70. Outra surpresa: a mãe do escritor, dado que trajasse vestido fora do uso e humilde no estofo, recebeu-a com ar tão senhoril e de primoroso trato que não se estremava das marquesas das suas relações.
- Foi uma indiscrição talvez o incómodo que lhe dei... - tartamudeou a fidalga, enquanto Ricardina a remirava de chapa, exprimindo o íntimo alvoroço. - Queira sentar-se; minha senhora, e peço-lhe que desculpe a minha turvação.
- Temos de nos desculpar uma à outra - disse Ricardina com a voz tremente. - Se alguma de nós deve estar comovida, sou eu.
Saltaram-lhe as lágrimas; porque Matilde era o retrato de Eugénia Pimentel.
- Porque chora, minha senhora? - acudiu a viscondessa, tomando-lhe as mãos enternecida.
- Conheci uma senhora que era o retrato de... de vossa Excelência - proferiu a custo Ricardina. - Fez-me muito vivas saudades, porque é já morta... Chamava-se Eugénia.
- Como? Eugénia!... A minha mãe também se chamava Eugénia.
- A minha amiga era a mãe da vossa Excelência - afirmou Ricardina.
- A senhora conheceu a minha mãe?! - disse Matilde.
- Como se conhece uma irmã. Fomos tão amigas... que se hoje nos encontrássemos apenas poderíamos conversar chorando.
- Mas onde conheceu minha mãe?! Ela nunca saiu da Beira!
- Bem sei, minha senhora. Saiu da abadia de Espinho, onde nasceu, para a casa dos Pimenteis da Reboliça, onde morreu.
- Jesus! Como sabe a senhora estas coisas?!.