CAPÍTULO XXVII - O RETRATO DE RICARDINA Abeirou-se Alexandre do catre.
- Não venho somente visitá-lo - disse ele. - Venho pedir-lhe que me deixe ser seu enfermeiro em casa da minha mulher. Ela e a minha mãe também lhe pedem.
- Não tive a honra de beijar as mãos a Suas Excelências: mas irei agradecer-lhes tamanha honra logo que possa. A minha enfermidade é passageira. São três dias pelo costume. Isto cede à quina, enquanto a morte não vier resolvida a zombar da quina. Por enquanto, parece-me que a inimiga dos desgraçados anda por longe a decepar cabeças ardentes de esperanças, e a orfanar criancinhas. Os homens inúteis como eu morrem tarde.
- Aí começa com as tolices! - disse Norberto.
Alexandre olhou contra o desempenado interventor e disse:
- Quem é este homem? É seu criado?
- Não, senhor! É um meu amigo de vinte e seis anos.
Alexandre remirou o septuagenário, e disse:
- E uma raridade!
- Vou à botica, Sr. Doutor? - disse Norberto.
- Vai.
Bernardo Moniz tinha a camisa desabotoada no pescoço, e por entre os peitos dela deixava ver uma medalha de ouro cuja circunferência cobriria a palma da mão. Alexandre reparou; e animado pelo afeto que tinha ao seu colaborador, disse, indigitando a medalha:
- São relíquias da juventude?
- São; conservo-as como adorno do cadáver. Pode ser que vossa Excelência assista ao meu passamento; chegada essa hora incerta, não permita que me despojem desta medalha. Não podia cair mais a propósito o pedido. Seria ingratidão esconder o tesouro cuja defesa se pede. Veja Vossa Excelência. É um retrato de mulher.
Alexandre examinou a pintura em marfim, e disse comovido:
- Formosíssima!... Que anos teria?... Parece-me tão criança!
- Tinha dezasseis para dezassete.