Nunca mais tornaria a ver aquela branca cidade. Não fora ali feliz. Mas amamos todos aqueles lugares em que por qualquer sentimento ou por qualquer ideia a nossa natureza palpitou fortemente. E ali tinham ficados minhas.
Logo no primeiro dia de viagem, Carmen esteve expirante. Havia um forte balanço. O mar era grosso, e nós receávamos mau tempo quando nos avizinhássemos das correntes do golfo de Lião.
Carmen quase sempre queria estar na tolda, ao ar, ao sol, vendo o mar. Arranjava-se-lhe uma cama, e ali ficava, olhando, cismando, sofrendo, e conversando com o capelão de lord Grenlei, velho cheio duncção, que tinha um encanto singular falando das coisas do céu. Aquela cena era profundamente triste, sobretudo de tarde; o sol caía, a imensa sombra começava a cobrir o mar: Carmen falava baixo: nós, em redor, escutávamo-la, ou, calados, seguíamos o correr da maresia, olhávamos o fim da luz. Um marinheiro escocês vinha às vezes cantar as arias das suas montanhas, cantos de uma tristeza suave e larga como a vista de um lago.
Ao terceiro dia de viagem, Carmen, subitamente, teve um grande acesso de febre e quis confessar-se. O médico disse-nos que ela não chegaria a ver as montanhas da Espanha. Que horas dolorosas! Não imagina, senhor redator, que intensidade têm, na vasta extensão das águas, as dores humanas! Junta-se-lhes o sentimento da imensidade, e não sei que terrível instinto do irreparável.
A confissão de Carmen foi longa. Quando terminou quis falar-me.
- Adeus! disse-me ela, vou morrer.
Disse-lhe que não, quis dar-lhe esperanças efémeras.
- Não, não, respondeu ela, nada de enganos. Tenho coragem. Quem a não tem para ser feliz? Chame lord Grenlei.
Começou então diante de nós a falar da sua vida. Disse-nos qual fora a sua mocidade, os desvarios do seu coração, a exigência das suas paixões, e falou-nos da sua ligação com Ritmel, com elevação, como de um sentimento quase legítimo.