TERCEIRA PARTE - DE F… AO MÉDICO
CAPÍTULO I Julho 21 à 1 hora da noite.
- Meu querido amigo.
- Ignoro se estás na tua casa, para onde te dirijo esta carta, ou se continuas, como eu, permanecendo aqui em carcere privado. Em qualquer dos casos, recebidas agora ou encontradas mais tarde, estas letras ficarão encerrando para aquele de nós que houver de as ler a lembrança proveitosa das horas mais extraordinárias da nossa vida.
Escrevo mais para coordenar e fixar na memória estes momentos do que para empregar noutro destino puramente hipotético esta carta. Será uma página das minhas confidências que entregarei à discrição ou ao acaso da posta, reservando-me o direito de lhe pedir que mas restitua ao seu tempo.
Não tornei a ter noticia tuas desde que nos separámos ontem à noite, pouco tempo depois de termos entrado na sala em que estava o cadáver. O mascarado que se encarregara de me conduzir ao quarto onde me acho deu-me o seu braço e disse-me ao ouvido um nome de mulher, a indicação de uma rua e o número de uma porta. Era o nome da pessoa que sabes e a designação da casa em que ela mora! Creio que involuntariamente estremeci, mas consegui dizer serenamente:
- Não o compreendo.
Este individuo era o mesmo que na carruagem se conservara sempre calado, o mesmo que na sala me observava com atenção e desconfiança.
Aquela estatura, aquela fala, aquela voz, posto que apenas percetível ao meu ouvido, não eram novas para mim.
Ele respondeu falando-me ainda mais baixo:
- Não poderá sair daqui antes de dois ou três dias. Veja se precisa de escrever uma carta ou de mandar um recado.
Passou-me pela mente uma ideia a respeito daquele homem… Se fosse…
Ocorreu-me que teria um meio de desenganar-me se era efetivamente ou se não era um amigo íntimo que eu tinha ao meu lado: arrancar-lhe o relógio; bastar-me-ia apalpa-lo, ainda vendado como eu estava, para reconhecer o dono.