ligado com aquele infeliz rapaz, tão fatalmente morto, motivado a sua presença em Lisboa, e determinado esse desenlace passado numa alcova solitária, numa casa casual, ao desmaiado clarão de uma vela, ao pé de um ramo de flores murchas. Outros, os que o sabem, que contem os transes dessa noite. Eu não. Não quero ouvir apregoar pelos vendedores de periódicos a história das dores mais profundas de um coração que estimo.
Senhor redator, há três anos a casa onde eu mais vivia em Lisboa, aquela em que tinha sempre o meu talher, e a minha carta de whist, onde ria as minhas alegrias, e fazia confidências das minhas tristezas, era a casa do conde de W. A condessa era minha prima.
Era uma mulher singularmente atraente: não era linda, era pior: tinha a graça. Eram admiráveis os seus cabelos loiros e espessos; quando estavam entrelaçados e enrolados, com reflexos de uma infinita doçura de ouro, parecia serem um ninho de luz. Um só cabelo que se tomasse, que se estendesse, como a corda num instrumento, de encontro à claridade, reluzia com uma vida tão vibrante que parecia ter-se nas mãos uma fibra tirada ao coração do sol.
Os seus olhos eram de um azul profundo como o da água do Mediterrâneo. Havia neles bastante império para poder domar o peito mais rebelde; e havia bastante meiguice e mistério, para que a alma fizesse o estranho sonho de se afogar naqueles olhos.
Era alta bastante para ser altiva; não tão alta que não pudesse encostar a cabeça sobre o coração que a amasse. Os seus movimentos tinham aquela ondulação musical, que se imagina do nadar das sereias.
De resto, simples e espirituosa.
Dizer-lhe que os meus olhos nunca se demoraram amorosamente na pureza infinita da sua testa, e na curva do seu seio seria de um estranho orgulho.