Nunca tivera a curiosidade, segundo ele próprio dizia, de ir ao teatro ver os actores de Paris, enquanto residira em Ruão. Não sabia nadar, nem manejar as armas, nem atirar à pistola, e certo dia nem foi capaz de lhe explicar um termo de equitação que ela encontrara num romance.
Não devia um homem, pelo contrário, saber tudo, ser exímio em múltiplas actividades, iniciar a mulher nas energias da paixão, nos requintes da vida, em todos os mistérios? Mas aquele não ensinava nada, não sabia nada e não aspirava a nada. Supunha-se feliz, e ela detestava-o por aquela calma tão bem assente, aquela serena inércia, a própria felicidade que lhe dava.
Ela às vezes desenhava; e para Charles era um grande divertimento ficar ali, de pé, a vê-la curvada sobre o papel, piscando os olhos para observar melhor o trabalho, ou enrolando bolinhas de miolo de pão entre o polegar e o indicador. No que respeita ao piano, quanto mais depressa corriam os dedos sobre o teclado, mais ele se maravilhava. Ela batia as teclas com força e percorria de uma ponta à outra todo o teclado sem se interromper. Assim sacudido, o velho instrumento, com as cordas à vibrar exageradamente, ouvia-se até ao extremo da aldeia se a janela estivesse aberta, e muitas vezes o ajudante do oficial de diligências, que passava na estrada, sem chapéu e de tamancos, parava para escutar, com a sua folha de papel na mão.
Emma, por outro lado, sabia dirigir a casa. Mandava aos doentes as contas das visitas, em cartas muito bem redigidas que nem cheiravam a facturas. Quando, ao domingo, convidavam algum vizinho para jantar, ela arranjava maneira de oferecer um prato bem apresentado, tinha habilidade para dispor sobre folhas de parreira pirâmides de rainhas-cláudias, servia pudins desenformados sobre um prato e até dizia que havia de comprar tacinhas para a sobremesa.