XXI - O que vale uma resoluçãoCecília, pensando que o pai não prolongaria demasiado o passeio, voltou a casa ainda com dia.
Anoiteceu, porém, sem que Manuel Quintino aparecesse.
Tudo era sombras na rua: para o lado do mar coloria-se o céu do rubor inflamado do crepúsculo… e ninguém!
O coração de Cecília principiou a enevoar-se de vagos receios, que ela até fugia de definir.
Mas estas névoas foram-se condensando em cerração, à medida que descia a noite e Manuel Quintino sem aparecer! A imaginação de Cecília começava já a lembrar-lhe mil escuras explicações daquela extraordinária demora.
A boa rapariga não podia sossegar.
Vinha à janela com esperança de avistar o pai no princípio da rua, e retirava-se para dentro outra vez, pesarosa e assustada porque o não via.
Falava a Antónia, desejando ouvir dela alguma suposição que a tranquilizasse; mas a criada, também assustada com a demora do amo, longe de a animar, aterrava-a com as sugestões da sua fértil imaginativa.
– Olhem agora! – dizia ela. – Não que uma demora assim! Eu nunca vi!… Quem sabe lá? Não lhe fosse por aí acontecer alguma!…
– O que lhe havia de acontecer, mulher? Você também! – disse Cecília, transida de susto com esta vaga insinuação da criada.
– O que lhe havia de acontecer? – prosseguiu esta. – Elas em qualquer parte se armam. Até na cama se quebra uma perna. Veja aquele velho que passava dantes todos os dias por aqui para a alfândega. Então não escorregou um dia no degrauzito da porta, que não tinha mais que isto – e indicava uma mão travessa –; caiu, e de tal maneira, que no fim de oito dias estava enterrado.
Cecília empalidecia só de ouvir estas palavras.
– Mas, se tivesse sucedido alguma coisa, tinham já mandado dizer.
– Conforme, menina… Às vezes acontecem os males em sítios onde ninguém conhece uma pessoa, e, se se não pode falar… Aí está que…
– Havia logo de suceder tudo mal.