VII - Revista da noite – Como te disse, Jenny – principiou Carlos, procedendo àquele extemporâneo almoço, às horas a que muita gente encetava a séria e importante tarefa da digestão do jantar – ontem correu-me a noite mais agradável que de costume.
– Sim? Então que te sucedeu?
– Eu te conto. Levantámo-nos da mesa às onze horas; foi um longo jantar, ao qual os brindes continuados não deixaram nunca desfalecer a animação. Entrei no teatro, um pouco atordoado e um pouco pesaroso; atordoado pelos efeitos excitantes daquelas muitas libações e daquele ruído todo…
– E pesaroso…
– Com os remorsos que a tua carta me veio despertar.
– Ah!… remorsos?!…
– Afianço-te que os tive. Nestas disposições de ânimo parecia-me um inferno o teatro, verdadeiros demónios aquelas ínsulas máscaras, gritos de condenados as desafinações da orquestra…
– E ficaste?
– E fiquei; fiquei, ansioso por que o final do divertimento me autorizasse a retirada. Já vejo que nem ideia fazes sequer destas coisas, que aliás são verdadeiras. Deixa-me continuar.
– Continua – disse Jenny, folheando ao acaso um livro de gravuras inglesas que estava na mesa. – Mas é deveras estranha essa maneira de te divertires… martirizando-te.
– É, confesso que é. Mas outros muitos estão neste caso; podes crê-lo.
– Bem; vamos adiante – replicou Jenny, fitando os olhos nas letras douradas da brochura.
Carlos prosseguiu:
– Deixei os meus companheiros e sentei-me extenuado; nem queria ver, nem apreciava nada do que em torno de mim sucedia. Afinal, porém, por fazer alguma coisa, reparei nos vizinhos de ombro a ombro entre quem a sorte me arrojara.
Jenny ergueu para o irmão a vista, com um modo particular.
– Do lado direito, encontrei um homem gordo, que dormia.