Ah! como Gervásio tinha razão, como eu no fundo abominava essa gente - os artistas. Isto é, os falsos artistas cuja obra se encerra nas suas atitudes; que falam petulantemente, que se mostram complicados de sentidos e apetites, artificiais, irritantes, intoleráveis. Enfim, que são os exploradores da arte apenas no que ela tem de falso e de exterior.
Mas, na minha incoerência de espírito, logo me vinha outra ideia: - Ora, se os odiava, era só afinal por os invejar e não poder nem saber ser como eles…
Em todo o caso, mesmo abominando-os realmente, o certo é que me atraíam como um vício pernicioso.
Durante uma semana - o que raro acontecia - estive sem ver Gervásio.
Ao fim dela, apareceu-me e contou-me:
- Sabe, tenho estreitado relações com a nossa americana. É na verdade uma criatura interessantíssima. E muito artista… Aquelas duas pequenas são amantes dela. É uma grande sáfica.
- Não…
- Asseguro-lhe.
E não falamos mais da estrangeira.
* * *
Passou-se um mês. Eu já me esquecera da mulher fulva, quando uma noite o escultor me participou de súbito:
- É verdade: aquela americana que eu lhe apresentei outro dia dá amanhã uma grande soirée. Você está convidado.
- Eu!? ..
- Sim. Ela disse-me que levasse alguns amigos. E falou-me de si. Aprecia-o muito… Aquilo deve ser curioso. Há uma representação no fim - umas apoteoses, uns bailados ou o quer que é. Entanto se é maçador para você, não venha. Eu creio que estas coisas o aborrecem…
Protestei, idiotamente ainda, como era meu hábito; afirmei que, pelo contrário, tinha até um grande empenho em o acompanhar, e marcamos rendez-vous para a noite seguinte, na Closerie, às dez horas.
No dia da festa, arrependi-me de haver aceitado. Eu era tão avesso à vida mundana… E depois, ter que envergar um smoking, perder uma noite…
Enfim… enfim…
Quando cheguei ao café - caso estranho! - já o meu amigo chegara.