Levantou-se Sancho, admirado, tanto da formosura da boa senhora, como da sua muita afabilidade e cortesia, e ainda mais de lhe haver dito que tinha notícia de seu amo, o cavaleiro da Triste Figura; e que, se lhe não chamara o dos Leões, devia ser por ele ter adotado esse nome há tão pouco tempo.
Perguntou-lhe a duquesa (cujo título ainda hoje se não sabe):
— Dizei-me, bom escudeiro: este vosso amo não é um de quem anda impressa uma história, que se chama do Engenhoso Fidalgo D. Quixote de la Mancha, e que tem por dama dos seus pensamentos uma tal Dulcineia del Toboso?
— É o mesmo, senhora — respondeu Sancho — e aquele seu escudeiro, que anda ou deve andar na tal história, e a quem chamam Sancho Pança, sou eu, a não ser que me trocassem no berço, quero dizer, que me trocassem na imprensa.
— Com tudo isso muito folgo — disse a duquesa. — Ide, bom Pança, e dizei a vosso amo que seja muito bem chegado e muito bem-vindo aos meus estados, e que nenhuma coisa poderia haver que mais contentamento me desse.
Sancho, portador de tão agradável resposta, com imenso gosto voltou para seu amo, a quem contou minuciosamente tudo o que a nobre senhora lhe dissera, levantando ao céu, com os seus rústicos termos, a sua muita formosura, o seu grande donaire e cortesia.
D. Quixote aprumou-se na sela com toda a galhardia, firmou-se nos estribos, ajustou a viseira, picou as esporas a Rocinante, e com gentil denodo foi beijar as mãos à duquesa, a qual, mandando chamar o duque, seu marido, enquanto D. Quixote se aproximava, lhe contou a sua embaixada toda, e ambos, por terem lido a primeira parte desta história, e terem sabido por ela a disparatada índole de D. Quixote, com imenso gosto e desejo de o conhecer o esperavam, no