Vai morrer a Mouca.
Limpam-lhe as prostitutas o suor da agonia e pé ante pé vêm os ladrões e os soldados para o redor da enxerga vê-la acabar. Moldado pelo lençol um corpo ressequido e no silêncio da espera ouve-se só a rala aflita, o estertor, a ânsia de quem quer ainda viva e que a morte estagna – mais perto! mais perto!...
O Velho, com a boca enorme some-se no escuro e de lá os seus olhos brilham; à cabeceira Sofia ajeita-lhe as repas curtas e húmidas. O lenço está ensopado de suor de aflição.
– Ajudai-a a morrer – diz uma das mulheres.
– Está a passar?
– Chiu! baixinho...
Chegam-se mais os ladrões e os soldados e curvam- se em volta da enxerga – o Pita, o Morto, os outros.
Nas feições cruéis, há espanto e terror.
– Inda fala?
– Chiu!...
Esperam. E a rala enrouquece, mais aguda, como se a morte fosse apertando – mais perto! mais perto!... A Mouca abre os olhos enormes na cara branca e imaterializada:
– Menina! menina, valha-me!...
– Estou ao pé de ti.
– Tenho frio, muito frio...
Juntam-se as caras dos ladrões e dos soldados, todos em roda – e pé ante pé também o Velho se chega para a cama. A Mouca abre os braços e dum lado o Morto, do outro Sofia, seguram-lhe as mãos.
– Aqui está uma manta – diz o Velho baixinho. E apresenta um farrapo de manta coçada.
– Chiu! já não precisa.
– É melhor deitá-la com a enxerga no chão, para acabar de penar – aconselha a patroa.
A Mouca respira aflita.
– Tenho frio... nas mãos, na cara...
Devagarinho, arrepanhando o lençol, rodeada de todos que a tinham maltratado, de todos os que se tinham rido dela, devagarinho se fina; a vida extingue-se-lhe como a última gota dum fio de água que acaba de correr.
Haviam ficado em volta imóveis.