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Capítulo 11: X - História do Gebo

Página 68
Às vezes a mulher nem descansar o deixava; queria falar, discutir, ouvi-lo:

– Dormes como um porco! Fala, escuta-me!

E o Gebo, a pingar de sono, lá se punha a dizer palavras, coisas desnorteadas, até que ela enfurecida exclamava:

– Dorme! Fica-te para aí!...

Mas tinha de acordar e a caça aos magros cinco tostões, que todos os dias precisava de juntar, começara a ser desorientada e feroz. Viam-no correr, espreitar um conhecido de outrora, segui-lo, dizer-lhe a sua aflição em palavras desconexas, e depois muito baixinho pedir esmola. Ficava horas à porta duma loja, esse velho trôpego, com o casaco no fio remendado pela filha, à espera que um conhecido passasse. Às vezes consumiam-se os dias e ele sem dinheiro para pão – porque os corações são de pedra. Rondava num desespero pelas ruas. Não encontraria alguém que lhe valesse?

Despediam-no, e ele fazia-se mais humilde, sem ódios, pedinchão e sempre a suar, Já não tinha que pôr no prego e muitas vezes se lembrava da morte.

Ao chegar a casa, sufocado, pesado, a mulher, que o esperava num transe, perguntava ao avistá-lo:

– E então? então?

– Cá está, mulher! cá está!

Oh descansar, dormir na terra bem pesada, bem funda, para sempre fugir àquela fadiga de lágrimas, esquecer as humilhações, as horas amargas passadas atrás dos que outrora servira! ficar no derradeiro sono, de que nunca mais se acorda nem para a desgraça, nem para o escárnio!...

E nem na própria casa o Gebo descansava. Precisava mentir. Eram infindáveis os ralhos e os gritos. Só Sofia, pela sua resignação, lhe dava ânimo. Se não fosse ela, seria tão bom morrer!... Os seus amigos estavam ricos e secos como as pedras. Alguns nem sequer o viam:

riam-se outros dele e não lhe davam esmola.

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pág. 68 (Capítulo 11)

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Capa do livro Os Pobres
Páginas: 158
Página atual: 68

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Carta-Prefácio 1
I - O enxurro 18
II - O Gebo 23
III - As mulheres 28
IV - O Gabiru 35
V - História do Gebo 42
VI - Filosofia do Gabiru! 49
VII - Primavera 52
VIII - Memórias de Luísa 59
IX - Filosofia do Gabiru 63
X - História do Gebo 67
XI - Luísa e o morto 73
XII - Filosofia do Gabiru 77
XIII - Essa rapariguinha 81
XIV - O escárnio 87
XV – Fala 94
XVI - O que é a vida? 97
XVII - História do Gebo 109
XVIII - O Gabiru treslê 114
XIX - A Mouca 118
XX - A outra primavera 121
XXI - A Morte 126
XXII - A filosofia do Gabiru 130
XXIII - A Árvore 134
XXIV - O ladrão e a filha 139
XXV - Natal dos pobres 143
XXI - Aí têm os senhores a natureza! 154