E mais fundo, mais fundo, assim se atascava na desgraça, gordo e pícaro, atarantado e pedinchão, com uma única ideia ao acordar: arranjar dinheiro para as mulheres comerem.
Já coçados e gastos, todos os dias diziam as mesmas palavras e passavam pelas mesmas aflições.
Transidos pelo frio interior, o verdadeiro frio, que só a miséria dá, encostados uns aos outros, raro se aqueciam ainda com um sonho vão. Fixavam o olhar, perdidos, absorvidos pela realidade, e a desgraça ali presente parecia rir-se. Gastavam as últimas roupas, faltavam já trapos usados e ele de cada vez mais gordo e mais mole.
Se acontecia rirem-se por futilidades, todos três juntos, aquele riso fazia mais aflição do que as próprias lágrimas.
Muitas noites não se acendia o lume e por fim todos três dormiam numa única enxerga.
A mulher já não ralhava: tombara, com o olhar desorientado e os dias gastos em monólogos desconexos.
Era o fim destas três figuras amarradas umas às outras pela desgraça – a figura que luta e espera, que espera sempre, numa discussão perpétua, que só na cova terá fim, seca de desespero e enorme; Sofia que não fala e se resigna, que não sabe queixar-se e esconde a sua dor; e o Gebo, amolgado pelos encontrões da vida, gordo, ridículo e de cabelos brancos estacados.
– Ó Gebo!
– Anh? anh?...
Viviam mais pobres que os pobres. Ele saía logo de manhã com a roupa no fio e as botas rotas. E a mulher ainda teimava:
– Homem, vê se te dão um emprego...
– Anh? Eu vejo! eu vejo!... Não te aflijas, mulher.
Um emprego! quem dá aí pão ao Gebo, amachucado e ridículo, envelhecido e trôpego, e que mal sabe escrever, de cego e tonto? Aguilhoado, todos os dias se levantava para a humilhação e para a correria atrás duns míseros cobres.