- Chega aqui um bocadinho, Grete disse a Senhora Samsa, com um sorriso trémulo. A filha seguiu-os até ao quarto, sem deixar de voltar-se para ver o cadáver.
A empregada fechou a porta e abriu a janela de par em par. Apesar de ser ainda muito cedo, sentia-se um certo calor no ar matinal. No fim de contas, estava-se já no fim de Março.
Emergindo do quarto, os hóspedes admiraram-se de não ver o almoço preparado. Tinham sido esquecidos.
- Onde está o nosso almoço? - perguntou sobranceiramente o hóspede do meio à criada. Esta, porém, levou o indicador aos lábios e, sem uma palavra, indicou-lhes precipitadamente o quarto de Gregório. Para lá se dirigiram e ali ficaram especados, com as mãos nos bolsos dos casacos, em torno do cadáver de Gregório, no quarto agora muito bem iluminado.
Nessa altura abriu-se a porta do quarto dos Samsa e apareceu o pai, fardado, dando uma das mãos à mulher e outra à filha. Aparentavam todos um certo ar de terem chorado e, de vez em quando, Grete escondia o rosto no braço do pai.
- Saiam imediatamente da minha casa! - exclamou o Senhor Samsa, apontando a porta, sem deixar de dar os braços à mulher e à filha.
- Que quer o senhor dizer com isso? - interrogou-o o hóspede do meio, um tanto apanhado de surpresa, com um débil sorriso. Os outros dois puseram as mãos atrás das costas e começaram a esfregá-las, como se aguardassem, felizes, a concretização de uma disputa da qual haviam de sair vencedores.
- Quero dizer exatamente o que disse respondeu o Senhor Samsa, - avançando a direito para o hóspede, juntamente com as duas mulheres. O interlocutor manteve-se no lugar, momentaneamente calado e fitando o chão, como se tivesse havido uma mudança no rumo dos seus pensamentos.
- Então sairemos, pois, com certeza - respondeu depois, erguendo os olhos para o Senhor Samsa, como se, num súbito acesso de humildade, esperasse que tal decisão fosse novamente ratificada.