O Cortiço - Cap. 8: Capítulo 8 Pág. 86 / 239

Bruno acabava de despejar o que era da mulher e saia de novo de casa, dando uma volta feroz à fechadura. Atravessou por entre o murmurante grupo dos curiosos que permaneciam defronte de sua porta, mudo, com a cara fechada, jogando os braços, como quem, apesar de ter feito muito, não satisfizera ainda completamente a sua cólera.

Leocádia apareceu pouco depois e, vendo por terra tudo que era seu, partido e inutilizado, apoderou-se de fúria e avançou sobre a porta, que o marido acabava de fechar, arremetendo com as nádegas contra as duas folhas, que cederam logo, indo ela cair lá dentro de barriga para cima.

Mas ergueu-se, sem fazer caso das risadas que rebentaram cá fora e, escancarando a janela com arremesso, começou por sua vez a arrasar e a destruir tudo que ainda encontrara em casa.

Então principiou a verdadeira devastação. E a cada objeto que ela varria para o pátio, gritava sempre: “Upa! Toma, diabo!”

— Aí vai o relógio! Upa! Toma, diabo!

E o relógio espatifou-se na calçada.

— Aí vai o alguidar!

— Aí vai o jarro!

— Aí vão os copos!

— O cabide!

— O garrafão!

— O bacio!

Um riso geral, comunicativo, absoluto, abafava o baralho da louça quebrando-se contra as pedras. E Leocádia já não precisava acompanhar os objetos com a sua frase de imprecação, porque cada um deles era recebido cá fora com um coro que berrava:

— Upa! Toma, diabo!

E a limpeza prosseguia. João Romão acudiu de carreira, mas ninguém se incomodou com a presença dele. Já defronte da porta do Bruno havia uma montanha de cacos acumulados; e o destroço continuava ainda, quando o ferreiro reapareceu, vermelho como malagueta, e foi galgando a casa, com um raio de roda de carro na mão direita.

Os circunstantes o seguiram, atropeladamente, num clamor.

— Não dá!

— Não pode!

— Prende!

— Não deixa bater!

— Larga o pau!

— Segura!

— Agüenta!

— Cerca!

— Toma o porrete!

E Leocádia escapou afinal das pauladas do marido, a quem o povaréu desarmara num fecha-fecha.

— Ordem!





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