» Deixei este escrito sobre as luvas de Vasco, e fui à estação dos caminhos-de-ferro.
» Dois dias depois entrava um paquete. Ao ver a minha pátria, cobri o rosto com as mãos, e chorei... Era a vergonha e o remorso. Diante do Porto senti uma inspiração do céu. Saltei numa catraia, e pouco depois achava-me nesta terra, sem um conhecimento, sem o apoio e sem subsistência para muitos dias.
» Entrei em casa de uma modista, e pedi obra. Não ma negou. Aluguei uma água-furtada, onde trabalho há quatro anos; onde, há quatro anos, comprimo bem aos rins, segundo a linguagem antiga, os cilícios do meu remorso.
» Minha mãe e meu irmão vivem. Julgam-me morta, e eu peço a Deus que não haja um indício da minha vida. Sê-me tu fiel, meu generoso amigo, não me denuncies, pela tua honra e pela sorte de tuas irmãs.
» Tu sabes o resto. Ouviste, no teatro, Elisa. Foi ela a que me disse que o seu marido a abandonara, chamando-lhe Laura. Aquela está punida...
» Sofia... (lembras-te de Sofia?) Essa é uma pequena aventura, que aproveitei para tornar menos insípidas aquelas horas em que me acompanhaste... Foi uma rival que não honra ninguém... Uma Laura com os respeitos públicos, e as considerações que se barateiam a corpos ulcerosos, contando que se vistam de veludos matizados. Ainda eu era feliz, quando o infame amante dessa mulher me dava aquele anel, que viste, como oblação de sacrifício que me fazia de um rival...
» Escreve-me.
» Hás-de ouvir-me no próximo Carnaval.
» Por último, Carlos, deixa-me fazer-ta uma pergunta: Não me achas mais defeituosa que o nariz daquela andaluza da história que te contei?
Henriqueta.