A Origem da Tragédia - Cap. 22: Capítulo 22 Pág. 129 / 164

A suposição da ópera é uma crença errada no processo artístico, é aquela crença idílica de que todo homem de sentimento é artista. No sentido desta crença é a ópera a expressão de existência leiga na arte, que dita as suas leis com o otimismo alegre do homem teórico.

Se desejarmos reunir sob um conceito as duas representações agora descritas e que influíram sobre o nascimento da ópera, devemos falar da tendência idílica da ópera, no que nos vemos obrigados a empregar exclusivamente as expressões e a explicação de Schiller. A natureza e o ideal representam, diz este, assunto de tristeza, se aquela é apresentada como tendo perdido tudo, e este como impossível de alcançar. Ou ambos — natureza e ideal — são assunto de alegria se são apresentados como verdadeiros. O primeiro caso origina a elegia em significação estreita, o segundo os idílios em sentido o mais amplo. Aqui deve chamar-se imediatamente a atenção para o caráter comum de ambas as apresentações na gênese da ópera, que nelas o ideal não é sentido como não-alcançado, nem a natureza como perdida. Havia, segundo este sentimento, um tempo primitivo do ser humano, no qual este se situava rente ao coração da natureza, tendo alcançado nesta naturalidade o ideal da humanidade, em bondade e estados artísticos paradisíacos. Todos nós descendemos de tal homem primitivo perfeito, e cuja imagem fiel ainda poderíamos ser, se deitássemos fora algumas qualidades a fim de nos reconhecermos como sendo tal homem primitivo, mediante renúncia voluntária à erudição supérflua, à cultura excessivamente rica. O homem de cultura da Renascença retrocedendo, por sua imitação operesca, da tragédia grega a uma consonância de natureza e ideal, de veracidade idílica, aproveitou ele esta tragédia, assim como Dante se aproveitou de Virgílio, para ser guiado até as portas do Paraíso; enquanto que ele continuou o seu caminho, passando da imitação das formas mais elevadas da cultura grega à “restituição de todas as cousas”, à imitação do primitivo mundo artístico do homem.





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