A Origem da Tragédia - Cap. 6: Capítulo 6 Pág. 31 / 164

Há uma lenda segundo a qual o rei Midas perseguiu na floresta, durante longo tempo, o sábio Sileno, companheiro de Dionísio, que se esquivava. Quando finalmente Sileno lhe caiu nas mãos pergunta-lhe o rei o que é o melhor e o mais conveniente para o homem. Firme e imóvel se cala o demônio; até que, forçado pelo rei, declara, entre gargalhadas, o seguinte: “Miserável geração monodiária, filho do acaso e da fadiga, porque é que tu me forças a dizer o que não te é proveitoso ouvir? O melhor para ti, é inacessível: É não ter nascido, não ser, ser nada — em segundo lugar, porém é... morrer em breve”.

Como se relaciona com esta sabedoria popular, o mundo das divindades olímpicas? Como a visão cheia de encantos do mártir torturado se relaciona com os seus tormentos.

Agora se nos abre, por assim dizer, o mágico monte Olimpo e nos mostra suas raízes. O grego conhecia e sentia os sustos e horrores da existência: mas, a fim de poder viver, os cobria com as brilhantes figuras de sonho dos Olímpicos. Aquela enorme desconfiança para com as forças titânicas da natureza; aquela Moira reinante sobre todos os conhecimentos, sem compaixão; aquele abutre do grande amigo da humanidade, Prometeu; aquela sorte espantosa do sábio Édipo; aquela maldição de raça dos Atridas, que força Orestes ao matricídio; enfim, toda aquela filosofia do deus da floresta, juntamente com seus exemplos míticos, em virtude da qual morreram os melancólicos etrúrios — foi suplantada continuamente pelos gregos por aquele mundo médio dos olímpicos; pelo menos coberta e afastada dos olhares. A fim de poder viver foram os gregos obrigados a criar esses deuses da maior necessidade; acontecimento que nós devemos representar certamente de tal maneira que a primitiva, titânica ordem divina do terror se transformasse por aquela ordem de beleza apolínica, com paulatinas transformações, na olímpica ordem divina da alegria; como rosas que brotam de espinhosa sebe.





Os capítulos deste livro