A Escrava Isaura - Cap. 13: Capítulo 13 Pág. 104 / 185

Entre eles acha-se um, sobre o qual nos é mister deter por mais um pouco a atenção, visto que tem de tomar parte um tanto ativa nos acontecimentos desta história. Este nada tem de esplenético nem de byroniano; pelo contrário o seu todo respira o mais chato e ignóbil prosaísmo. Mostra ser mais velho que os seus comparsas uma boa dezena de anos. Tem cabeça grande, cara larga, e feições grosseiras. A testa é desmesuradamente ampla, e estofada de enormes protuberâncias, o que, na opinião de Lavater, é indicio de espírito lerdo e acanhado a roçar pela estupidez. O todo da fisionomia tosca e quase grotesca revela instintos ignóbeis, muito egoísmo e baixeza de caráter. O que, porém, mais o caracteriza é certo espírito de cobiça, e de sórdida ganância, que lhe transpira em todas as palavras, em todos os atos, e principalmente no fundo de seus olhos pardos e pequeninos, onde reluz constantemente um raio de velhacaria. É estudante, mas pelo desalinho do trajo, sem o menor esmero e nem sombra de elegância, parece mais um vendilhão. Estudava há quinze anos à sua própria custa, mantendo-se do rendimento de uma taverna, de que era sócio capitalista. Chama-se Martinho.

- Rapaziada, - disse um dos mancebos, - vamos nós aqui a uma partida de lansquenê, enquanto esses basbaques ali estão a arrastar os pés e a fazer mesuras.

- Justo! - exclamou outro, sentando-se a uma mesa e tomando baralhos. - Já que não temos coisa melhor a fazer, vamos às cartas. Demais, no baralho é que está a vida. A vista de uma sota me faz às vezes estremecer o coração em emoções mais vivas do que as sentiria Romeu a um olhar de Julieta... Afonso, Alberto, Martinho, andem para cá; vamos ao lansquenê; duas ou três corridas somente...

- De boa vontade aceitaria o convite, - respondeu Martinho, - se não andasse ocupado com um outro jogo, que de um momento para outro, e sem nada arriscar, pode meter-me na algibeira não menos de cinco contos de réis limpinhos.





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