A Origem da Tragédia - Cap. 10: Capítulo 10 Pág. 54 / 164

É para uma tal maneira de pensar que a nossa época, que tão superior se considera, emprega o dito superior “pseudo-idealismo”. Temo porém que, com nossa atual idolatria do natural e verdadeiro, cheguemos ao pólo contrário de todo idealismo, isto é, à região da sala das figuras de cera. Mesmo neles há uma arte, como em certos romances estimados do presente, mas não se nos deve atormentar com a pretensão de que, com esta arte, se há-de superar o “pseudo-idealismo” de Schiller e Goethe.

É naturalmente um terreno “ideal” no qual, segundo a opinião sensata de Schiller, perambula o coro dos sátiros gregos, o coro da tragédia primitiva, um terreno muito acima do caminho comum dos mortais. O grego edificou, para este coro, os andaimes de um estado natural fingido, colocando nesses andaimes seres naturais, fictícios. A tragédia foi erigida sobre este fundamento e já por isso foi desobrigada, desde o início, de reproduções fiéis da realidade. Apesar disto não é um mundo fantasiado entre céu e terra, e sim um mundo da mesma autenticidade e realidade, como as possuía o Olimpo, juntamente com os seus moradores, para o heleno crédulo. O sátiro como corista dionisíaco vive numa realidade religiosa, admitida sob sanção do mito e do culto. Que com ele se inicia a tragédia, que dele fala a sabedoria dionisíaca da tragédia, é para nós um fenômeno tão estranhável, como o é a origem da tragédia, proveniente do coro. Talvez consigamos obter um ponto de partida, se eu colocar a suposição de que o sátiro, o ser natural fictício, se relacione com o homem culto como se relaciona a música dionisíaca com a civilização. Desta última diz Ricardo Wagner que ela é apagada pela música, como é o brilho da lâmpada pela luz do dia.





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