A Mulher de Trinta Anos - Cap. 5: Os dois encontros Pág. 141 / 205

O general tinha o rosto bastante crestado. Sua fronte alta e pura, riscada de fios de cabelo grisalho, o brilho másculo dos seus olhos azuis, a bravura inscrita nas rugas das faces pálidas, anunciavam que havia comprado por rudes esforços a fita vermelha que trazia à lapela. Nesse momento, as inocentes alegrias dos dois filhinhos refletiam-se na fisionomia vigorosa e firme, na qual transpareciam uma bonomia, uma candura indizíveis. Esse velho militar voltara a ser criança sem muito es forço. Não há sempre um pouco de amor pela infância nos soldados que experimentam as desgraças da vida o bastante para terem sabido reconhecer as misérias da força e os privilégios da fraqueza? Mais longe, em frente de uma mesa redonda, iluminada por lâmpadas astrais cujas luzes vivas lutavam com a claridade pálida das velas colocadas sobre a lareira, estava um menino de treze anos que virava rapidamente as folhas de um grande livro. Os gritos do irmão e da irmã não lhe causavam nenhuma distração, e seu rosto acusava a curiosidade da juventude. A profunda preocupação era justificada pelas interessantes maravilhas das Mil e uma noites e por um uniforme de estudante do liceu. Conservava-se imóvel numa atitude pensativa, um cotovelo sobre a mesa e a cabeça encostada a uma das mãos, cujos dedos brancos mais se salientavam entre o cabelo muito negro. Como a claridade só lhe incidia sobre o rosto, deixando o corpo na penumbra, semelhava-se assim a um desses retratos escuros, onde Rafael se representou a si mesmo, inclinado, atento, meditando sobre o futuro. Entre essa mesa e a marquesa, trabalhava uma donzela formosa e alta, sentada a um bastidor para o qual curvava ou afastava alternadamente a cabeça, cujos cabelos de ébano, artisticamente penteados, refletiam a luz.




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