A Mulher de Trinta Anos - Cap. 1: Primeiros erros Pág. 43 / 205

Durante dois anos, as vivas distrações e as inquietas alegrias que dão os cuidados maternais tornaram-lhe a existência menos infeliz. Separou-se necessariamente do marido. Os médicos prognosticaram-lhe melhor saúde mas a marquesa não deu crédito àqueles presságios. Como toda gente para quem a vida não tem encanto, via talvez na morte um desenlace feliz. No começo do ano de 1819, a vida tornou-se-lhe mais cruel que nunca. No momento em que aplaudia a felicidade negativa que soubera conquistar, entreviu abismos medonhos; o marido, pouco a pouco, desabituara-se dela. Esse resfriamento de uma afeição já tão morna e egoísta podia ser origem de mais um infortúnio que o seu fino tato e a sua prudência lhe faziam prever. Ainda que estivesse certa de conservar um grande poder sobre Victor e de haver obtido sua estima para sempre, temia a influência das paixões sobre um homem tão nulo e tão vaidosamente irrefletido. Muitas vezes, seus amigos surpreendiam Júlia em longas meditações; os menos perspicazes perguntavam-lhe a causa gracejando, como se uma jovem só pudesse pensar em frivolidades, como se não existisse quase sempre um sentido profundo nos pensamentos de uma mãe-de-família. De resto, tanto a desgraça como a verdadeira felicidade nos levam ao devaneio. Às vezes, brincando com sua Helena, Júlia fitava-a com um olhar sombrio e cessava de responder a essas interrogações infantis que causam tanto prazer às mães, para pedir conta do seu destino ao presente e ao futuro. Seus olhos enchiam-se então de lágrimas quando, de repente, qualquer recordação lhe reavivava a cena de revista nas Tulherias. As palavras previdentes do pai ressoavam-lhe de novo ao ouvido, e a consciência censurava-a por não as ter atendido. Dessa insensata desobediência provinham todos os seus infortúnios, e muitas vezes não sabia, entre todos, qual era o mais penoso.




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