A Mulher de Trinta Anos - Cap. 2: Sofrimentos desconhecidos Pág. 91 / 205

Isto é verdade, eu o sinto à medida que a minha pobre filha cresce, o meu coração se comprime. Os sacrifícios que lhe fiz separaram-me dela, enquanto para uma outra criança o meu coração teria sido inesgotável; para essa não haveria sacrifícios, tudo seria prazer. Neste ponto, senhor, a razão, a religião, tudo em mim se encontra sem força contra os meus sentimentos. Faz mal em querer morrer a mulher que não é mãe nem esposa e que, para sua desgraça, entreviu o amor nas suas infinitas belezas, a maternidade na sua felicidade sem limites? Que será dela? Posso dizer-lhe o que ela experimenta! Cem vezes durante o dia, cem vezes durante a noite, um estremecimento abala-me o cérebro, o coração, o corpo, quando alguma recordação muito fracamente combatida me reaviva as imagens de uma felicidade que suponho maior do que na realidade é. Essas fantasias cruéis fazem amortecer meus sentimentos e pergunto a mim mesma: - O que teria sido a minha vida, se...? - Júlia ocultou o rosto nas mãos e rompeu a chorar. - Aqui tem o fundo do meu coração! - prosseguiu. - Um filho dele ter-me-ia feito aceitar as mais horríveis desgraças. Deus, que morreu sob o peso de todas as culpas do mundo, há de me perdoar este pensamento mortal para mim; mas o mundo, sei bem que é implacável: para ele, as minhas palavras são blasfêmias; insulto todas as suas leis. Ah, gostaria de fazer a guerra contra este mundo, a fim de renovar suas leis e costumes, a fim de quebrá-los. Ele não me feriu em todas as minhas idéias, em todas as minhas fibras, em todos os meus sentimentos, em todos os meus desejos, em todas as minhas esperanças, no futuro, no presente, no passado? Para mim, o dia é cheio de trevas, o pensamento um gládio, o coração uma chaga, a minha filha uma negação.




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