A Mulher de Trinta Anos - Cap. 2: Sofrimentos desconhecidos Pág. 96 / 205

- A dor - replicou o padre - só é viável nas almas preparadas pela religião.

Abaixou respeitosamente os olhos para não deixar ver as dúvidas que podiam exprimir. A energia dos queixumes que ouvira da marquesa muito o contristara. Reconhecendo o eu humano sob as suas mil formas, desesperou de enternecer aquele coração que a dor endurecera em vez de abrandar e onde a semente divina não devia brotar, porque sua doce voz era sufocada pelo grande e terrível clamor do egoísmo. Contudo, desenvolveu a constância do apóstolo e voltou por diferentes vezes, sempre levado pela esperança de conquistar para Deus aquela alma tão nobre e orgulhosa; mas desanimou no dia em que descobriu que a marquesa só gostava de conversar com ele porque lhe era agradável falar daquele que já não existia. Não quis rebaixar o seu ministério, mostrando-se complacente com uma paixão; cessou suas práticas e voltou gradualmente às fórmulas e aos lugares-comuns da conversação.

Chegou a primavera. A marquesa encontrou distrações na sua profunda tristeza e ocupou-se das suas terras, comprazendo-se em ordenar alguns trabalhos. No mês de outubro deixou o velho castelo de Saint-Lange, onde se tomara viçosa e bela na ociosidade; a dor, primeiramente violenta como um disco lançado com vigor, acabara por amortecer na melancolia, como pára o disco depois de oscilações gradualmente mais fracas. A melancolia compõe-se de uma série de semelhantes oscilações morais, tocando a primeira no desespero e a última no prazer: na mocidade, é o crepúsculo da manhã; na velhice, o da noite.

Quando sua caleça passou pela aldeia, a marquesa recebeu o cumprimento do padre, que voltava da igreja para o presbitério; mas, em resposta, abaixou os olhos e desviou a cabeça para não vê-lo. O padre tinha demasiada razão contra essa pobre Artêmis de Éfeso.





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