Luís respondeu ao ouvidor, que lhe perguntara o motivo da sua vinda a pé, e vestido com trajos tão vis. O mancebo, agarrando-lhe fortemente as mãos, como em sinal de que alguma grande dor lhe pungia o coração, derramando lágrimas em grande abundância, disse-lhe:
— Senhor meu, não sei outra coisa dizer-vos, senão que, desde o momento em que o céu quis e a nossa vizinhança facilitou que eu visse a minha senhora D. Clara, vossa filha, desde esse instante lhe submeti a minha vontade; e, se a vossa, meu verdadeiro pai e senhor, a não impedir, hoje mesmo há-de ser minha esposa. Por ela deixei a casa de meus pais, e revesti este trajo, para a seguir fosse aonde fosse, como a seta ao alvo e o marinheiro ao norte. Ela dos meus desejos não sabe mais do que o que pôde entender algumas vezes, que de longe via chorar meus olhos. Já sabeis, senhor, a riqueza e a nobreza de meus pais, e de como sou o seu único herdeiro; se vos parecer que são partes estas para que vos arrisqueis a fazer-me em tudo venturoso, recebei-me logo por vosso filho; que se a meu pai, levado por outros desígnios, não agradar este bem que eu procurei para mim, mais força terá o tempo para desfazer e mudar as coisas do que a vontade humana.
Calou-se ao dizer isto o enamorado mancebo, e o magistrado ficou de o ouvir suspenso, confuso e admirado, tanto pelo modo e discrição como D. Luís lhe descobriu o seu pensamento, como por não saber a resolução que havia de tomar em tão repentino e inesperado negócio, e assim é que respondeu que por então sossegasse, e entretivesse os seus criados para que não o levassem nesse dia, e ele houvesse tempo para considerar o que a todos ficaria melhor. Beijou-lhe D. Luís à viva força as mãos, e banhou-lhas de lágrimas que enterneceriam