E, dizendo isto, desmaiava de modo que todos os presentes pensavam que em cada desmaio lhe fugiria a alma. Quitéria, toda honesta e vergonhosa, agarrando com a mão direita na mão de Basílio, disse-lhe:
— Não haveria força que pudesse torcer a minha vontade, e assim com meu livre alvedrio te dou a mão de legítima esposa, e recebo a tua, se ma dás de livre vontade, sem que a turbe nem a contraste a calamidade produzida pela tua precipitada resolução.
— Dou, sim — respondeu Basílio — não turbado nem confuso, mas com o claro entendimento que o céu me concedeu, e assim me entrego por teu esposo.
— Eu por tua esposa — respondeu Quitéria — quer vivas por largos anos, quer te arranquem dos meus braços para a sepultura.
— Este moço, para os ferimentos que tem, muito fala — acudiu Sancho Pança; — digam-lhe que atenda à sua alma, que, ao que me parece, tem-na mais na língua que nos dentes.
Estando, pois, de mãos dadas Basílio e Quitéria, o cura, comovido e choroso, deitou-lhes a bênção, e pediu ao céu que salvasse a alma do novo esposo, o qual, assim que recebeu a bênção, com grande ligeireza se pôs de pé, e com pasmosa desenvoltura arrancou o estoque, a que o seu corpo servia de bainha.
Ficaram todos os circunstantes admirados, e alguns deles, mais simples do que curiosos, em altas vozes começaram a bradar:
— Milagre! milagre!
Mas Basílio respondeu:
— Não é milagre, milagre, mas indústria, indústria!
O cura, atônito e desnorteado, correu com ambas as mãos a apalpar a ferida, e viu que o estoque atravessara não a carne, nem as costelas de Basílio, mas um tubo oco de ferro que ele tinha ali perfeitamente acomodado, como depois se soube.