Ficou D. Quixote admirado de ouvir a Roque tão boas e concertadas razões, porque pensava que entre os que tinham estes ofícios de roubar, matar e assaltar, não podia haver quem tivesse bom discorrer; e respondeu-lhe:
— Senhor Roque, o conhecimento da enfermidade e o querer tomar o enfermo os remédios que o médico receita são o princípio da saúde: Vossa Mercê está enfermo, conhece a sua doença, e o céu, ou Deus, para melhor dizer, que é o nosso médico, lhe aplicará remédios que o sarem, remédios que costumam curar a pouco e pouco, e não de repente e por milagre; e, além disso, os pecadores discretos estão mais próximos de emendar-se, do que os simples; e, como Vossa Mercê mostrou no seu arrazoado a sua prudência, tenha ânimo e espere, que há-de melhorar da enfermidade da sua alma; e se quiser poupar caminho e entrar com facilidade no da sua salvação, venha comigo, que eu o ensinarei a ser cavaleiro andante, profissão em que se passam tantos trabalhos e desventuras, que, tornando-as por penitência, põem-no em duas palhetadas no caminho do céu.
Riu-se Roque do conselho de D. Quixote, a quem, mudando de conversação, contou o trágico sucesso de Cláudia Jerônima, ficando muito pesaroso Sancho, a quem não tinha parecido mal a beleza, desenvoltura e brio da moça. Nisto, chegaram os escudeiros do roubo, trazendo consigo dois cavaleiros e dois peregrinos a pé, e um coche de mulheres, com seis criados a pé e a cavalo, que as acompanhavam, e mais dois moços de mulas, que os cavaleiros traziam. Meteram-nos no meio os escudeiros, guardando vencidos e vencedores um grande silêncio, à espera que falasse o grande Roque Guinart, o qual perguntou aos cavaleiros quem eram, para onde iam e que dinheiro levavam.
Um deles respondeu: