XVII
Não façais rumor, cidadãos atenienses, mas perseverai no que vos estou dizendo, isto é, não vocifereis pelas coisas que vos digo, mas ouvi-me; pois escutando-me, penso que tirareis proveito.
Aqui estou para vos dizer algumas outras coisas, e talvez, por isso, levantareis a voz, mas não o deveis fazer. Sabei-o bem: se me condenais a morrer, a mim que sou tal como eu digo, não causareis maior dano a mim que vós mesmos. E, de fato, nem Meleto, nem Anito me poderiam fazer mal em coisa em alguma: isso jamais seria possível, pois que não pode acontecer que um homem melhor receba dano de um pior. É possível que me mandem matar, ou me exilem, ou me tolham os direitos civis; mas provavelmente, eles ou quaisquer outros reputam tais coisas como grandes males, ao passo que eu não considero assim, e, ao contrário considero muito maior mal fazer o que agora eles estão fazendo, procurando matar injustamente um homem.
Ora, pois, cidadãos atenienses, estou bem longe de me defender por amor a mim mesmo, como alguém poderia supor, mas por amor a vós, para que, condenando-me, não tenhais de cometer o erro de repelir o dom de mim que vos fez o deus. Pois que, se me mandares matar, não encontrareis facilmente outro igual, que (pode parecer ridículo dizê-lo) tenha sido adaptado pelo deus à cidade, do mesmo modo com a um cavalo grande e de pura raça, mas um pouco lerdo pela sua gordura, é aplicada a necessária esporada para sacudi-lo assim justamente me parece que o deus me aplicou à cidade, de maneira que, despertando cada um de vós e persuadindo-vos e desaprovando-vos, não deixo de vos esporar os flancos, por toda a parte, durante todo o dia.