O Raposo - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 38 / 111

. Mas toda ela parecia perdida numa aura de devaneio, como se na verdade estivesse muito longe dali. Numa espécie de sonho acordado, parecia-lhe ouvir o regougar do raposo no vento que assobiava à volta da casa, um cântico selvagem e doce como uma louca obsessão. Com as suas mãos rosadas e bem feitas, desfiava vagarosamente o algodão branco num croché lento, desajeitado.

Banford, sentada na sua cadeira baixa, tentava igualmente ler. Mas sentia-se algo nervosa no meio daqueles dois. Não parava de se mexer e de olhar em volta, ouvindo o sibilar do vento enquanto espreitava furtivamente ora um ora outro dos seus companheiros. March, de costas direitas contra o espaldar da cadeira, as pernas cruzadas sob as calças justas, entregue ao seu croché lento, laborioso, também a deixava preocupada.

- Oh, meu Deus! - exclamou Banford. Os meus olhos não estão nada bons esta noite. - E esfregava-os com os dedos.

O jovem levantou a cabeça, fitando-a com olhos claros e vivos, mas nada disse.

- Ardem-te, é, Bill? - perguntou March distraidamente.

O jovem recomeçou então a ler e Banford viu-se obrigada a voltar ao seu livro. Mas não conseguia estar quieta. Ao fim de algum tempo, olhou para March, um estranho sorriso maldoso desenhando-se-lhe no rosto magro.

- Um penny pelos teus pensamentos, Nellie - disse, de súbito.

March olhou em volta com um ar espantado, os olhos negros muito abertos, tornando-se então muito pálida, como se tomada de pânico. Tinha estado a ouvir o cântico do raposo, elevando-se nos ares com uma tão profunda, inacreditável ternura, enquanto ele errava em torno da casa.

- O quê? - perguntou num tom abstrato.

- Um penny pelos teus pensamentos - repetiu Banford, sarcástica. - Ou até mesmo dois, se forem assim tão profundos.





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