- Irra! É de mais! Logo nessa semana, sem escolher, Jacinto «Galião» comprou a um príncipe polaco, que depois da tomada de Varsóvia se metera frade cartuxo, aquele palacete dos Campos Elísios, nº 202. E sob o pesado ouro dos seus estuques, entre as suas ramalhudas sedas se enconchou, descansando de tantas agitações, numa vida de pachorra e de boa mesa, com alguns companheiros de emigração (o desembargador Nuno Velho, o conde de Rabacena, outros menores), até que morreu de indigestão, de uma lampreia de escabeche que lhe mandara o seu procurador em Montemor. Os amigos pensavam que a D. Angelina Fafes voltaria ao reino. Mas a boa senhora temia a jornada, os mares, as caleças que racham. E não se queria separar do seu Confessor, nem do seu Médico, que tão bem lhe compreendiam os escrúpulos e a asma.
- Eu, por mim, aqui fico no 202 - declarara ela - ainda que me faz falta a boa água de Alcolena... O Cintinho, esse, em crescendo, que decida.
O Cintinho crescera. Era um rapaz mais esguio e lívido que um círio, de longos cabelos corredios, narigudo, silencioso, encafuado em roupas pretas, muito largas e bambas; de noite, sem dormir, por causa da tosse e de sufocações, errava em camisa com uma lamparina através do 202; e os criados na copa sempre lhe chamavam a «Sombra».