CAPÍTULO III No 202, todas as manhãs, às nove horas, depois do meu chocolate e ainda em chinelas, penetrava no quarto de Jacinto. Encontrava o meu amigo banhado, barbeado, friccionado. envolto num roupão branco de pêlo de cabra do Tibete, diante da sua mesa de toilette; toda de cristal (por causa dos micróbios) e atulhada com esses utensílios de tartaruga, marfim, prata, aço e madrepérola que o homem do século XIX necessita para não desfear o conjunto sumptuário da Civilização e manter nela o seu Tipo. As escovas sobretudo renovavam, cada dia, o meu regalo e o meu espanto - porque as havia largas como a roda maciça de um carro sabino, estreitas e mais recurvas que o. alfange de um mouro, côncavas, em forma de telha aldeã; pontiagudas, em feitio de folha de hera; rijas que nem cerdas de javali; macias que nem penugem de rola! De todas, fielmente, como amo que não desdenha nenhum servo, se utilizava o meu Jacinto. E assim, em face ao espelho emoldurado de folhedos de prata, permanecia este Príncipe Passando pêlos sobre o seu pêlo durante catorze minutos.
No entanto o Grilo e outro escudeiro, por trás dos biombos de Quioto, de sedas lavradas, manobravam, com perícia e vigor, os aparelhos do lavatório - que era apenas um resumo das máquinas monumentais da Sala de Banho, a mais extremada maravilha do 202 - Nestes mármores simplificados existiam unicamente dois jatos graduados desde zero até cem; as duas duchas, fina e grossa, para a cabeça; a fonte esterilizada para os dentes; o repuxo borbulhante para a barba; e ainda botões discretos, que, roçados, desencadeavam esguichos, cascatas cantantes, ou um leve orvalho estival. Desse recanto temeroso, onde delgados tubos mantinham em disciplina e servidão tantas águas ferventes,