Auto da Alma - Cap. 9: Parte VII Pág. 19 / 31

Desterrei da minha mente

os meus perfeitos arreios

naturais;

não me prezei de prudente,

mas contente

me gozei com os trajos feios

mundanais.

Cada passo me perdi;

em lugar de merecer,

eu sou culpada.

Havei piedade de mi,

que não me vi;

perdi meu inocente ser,

e sou danada.

E, por mais graveza, sento

não poder-me arrepender

quanto queria;

que meu triste pensamento,

sendo isento,

não me quer obedecer,

como soía.

Socorrei, hóspeda senhora,

que a mão de Satanás

me tocou,

e sou já de mim tão fora,

que agora

não sei se avante, se atrás,

nem como vou.

Consolai minha fraqueza

com sagrada iguaria,

que pereço,

por vossa santa nobreza,

que é franqueza;

porque o que eu merecia

bem conheço.

Conheço-me por culpada,

e digo diante vós

minha culpa.





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