Estando todos a contemplá-lo, como dissemos, de repente, entre as outras donas e donzelas da duquesa, levantou a voz a desenvolta e discreta Altisidora, e, fitando bem o cavaleiro, disse em tom plangente:
Sopeia um pouco essas rédeas, e escuta, mau cavaleiro; não fatigues as ilhargas desse teu nobre sendeiro.
Refalsado, tu não foges de alguma fera serpente, foges de uma cordeirinha tenra, cândida, inocente.
Tu escarneceste, ó monstro, a donzela menos feia, que viu Diana em seus montes, e em seus bosques Citereia.
Ingrato Eneias e feroz Teseu, Barrabás te acompanhe, meu sandeu!
Tu levas, que roubo ímpio!
nas tuas garras grifanhas, de uma terna namorada as humílimas entranhas.
Levas três lenços, e as ligas de umas pernas torneadas, que são como o puro mármore, lisas, duras, jaspeadas.
Levas também mil suspiros, cujo ardor talvez pudesse abrasar outras mil Troias, se outras mil Troias houvesse.
Ingrato Eneias e feroz Teseu, Barrabás te acompanhe, meu sandeu!
Que do teu Sancho as entranhas sejam, para teu tormento, tão duras, que Dulcineia não saia do encantamento.
Que a triste leve o castigo da tua culpa tamanha, que justos por pecadores pagam sempre cá na Espanha.
Que as mais finas aventuras para ti sejam tristezas, sonhos os teus passatempos, olvidos tuas firmezas!
Ingrato Eneias e feroz Teseu, Barrabás te acompanhe, meu sandeu!
Que sejas tido por falso de Sevilha a Finisterra, desde Loja até Granada, e de Londres a Inglaterra.