A partir dessa noite, da qual só pela manhã o Miranda se retirou do quarto da mulher, estabeleceu-se entre eles o hábito de uma felicidade sexual, tão completa como ainda não a tinham desfrutado, posto que no intimo de cada um persistisse contra o outro a mesma repugnância moral em nada enfraquecida.
Durante dez anos viveram muito bem casados; agora, porém, tanto tempo depois da primeira infidelidade conjugal, e agora que o negociante já não era acometido tão frequentemente por aquelas crises que o arrojavam fora de horas ao dormitório de Dona Estela; agora, eis que a leviana parecia disposta a reincidir na culpa, dando corda aos caixeiros do marido, na ocasião em que estes subiam para almoçar ou jantar.
Foi por isso que o Miranda comprou o prédio vizinho a João Romão.
A casa era boa; seu único defeito estava na escassez do quintal; mas para isso havia remédio: com muito pouco compravam-se umas dez braças daquele terreno do fundo que ia até à pedreira, e mais uns dez ou quinze palmos do lado em que ficava a venda.
Miranda foi logo entender-se com o Romão e propôs-lhe negócio. O taverneiro recusou formalmente.
Miranda insistiu.
— O senhor perde seu tempo e seu latim! retrucou o amigo de Bertoleza. Nem só não cedo uma polegada do meu terreno, como ainda lhe compro, se mo quiser vender, aquele pedaço que lhe fica ao fundo da casa!
— O quintal?
— É exato.
— Pois você quer que eu fique sem chácara, sem jardim, sem nada?
— Para mim era de vantagem...
— Ora, deixe-se disso, homem, e diga lá quanto quer pelo que lhe propus.
— Já disse o que tinha a dizer.
— Ceda-me então ao menos as dez braças do fundo.
— Nem meio palmo!
— Isso é maldade de sua parte, sabe? Eu, se faço tamanho empenho, é pela minha pequena, que precisa, coitada, de um pouco de espaço para alargar-se.
— E eu não cedo, porque preciso do meu terreno!
— Ora qual! Que diabo pode lá você fazer ali? Uma porcaria de um pedaço de terreno quase grudado ao morro e aos