“Cumpro religiosamente as minhas promessas. Tu não avalias o sacrifício que faço. Não importa. Como não quero cativar a tua gratidão, nem, mesmo ainda, mover a tua piedade, basta-me a consciência do que sou para ti, que é (medita bem) o mais que posso ser...
A história... não é assim? Principia agora.
António Alves era um pobre amanuense do escritório de um tabelião de Lisboa.
O tabelião morreu, e António Alves, privado dos escassos lucros de amanuense, lutou com a fome. A mulher por um lado com a filhinha ao colo, e ele pelo outro com as lágrimas da indigência, conseguiram algumas moedas, e com elas a passagem do pobre marido para o Rio de Janeiro.
Foi, e deixou entregues à Providência a mulher e a filha.
Josefa esperava todos os dias carta de seu marido. Nem carta, nem um indício da sua existência. Julgou-se viúva, vestiu-se de preto e viveu de esmolas, pedidas à noite na praça do Rossio.
A filha chamava-se Laura, e crescera bela, não obstante as angústias da fome, que transformam a formosura do berço.
Aos quinze anos de Laura, já sua mãe não mendigava. A desonra proporcionara-lhe abundância que uma honrosa mendicidade lhe não dera.
Laura era amante de um rico, que cumpria fielmente com a mãe as condicionais estipuladas na escritura de venda da filha.
Um ano depois, Laura explorava outra mina. Josefa não sofria com as vicissitudes da filha, e continuava a gozar os fins da vida à sombra de tão fecunda árvore.
A indigência e a sociedade fizeram-lhe compreender que só há desonra na fome e na nudez.
Outro ano depois, a radiosa Laura declarou-se o prémio do cavaleiro que mais airoso entrasse no torneio.
Concorreram muitos gladiadores, e parece que todos foram premiados, porque todos esgrimiam galhardamente.