A Cidade e as Serras - Cap. 8: CAPÍTULO VIII Pág. 131 / 238

.. Mas depois, noutras salas, o soalho alternava com remendos de tábuas novas. Os mesmos remendos claros mosqueavam os velhíssimos tetos de rico carvalho sombrio. As paredes repeliam pela alvura crua da cal fresca. E o sol mal atravessava as vidraças - embaciadas e gordurentas da massa e das mãos dos vidraceiros.

Penetrámos enfim na última, a mais vasta, rasgada por seis janelas, mobilada com um armário e com uma enxerga parda e curta estirada a um canto: e junto dela parámos. E sobre ela depusemos tristemente o que nos restava de vinte e três malas - o meu paletó alvadio, a bengala de Jacinto, e o «Jornal. do Comércio» que nos era comum. Através das janelas escancaradas, sem vidraças, o grande ar da serra entrava e circulava como num eirado, com um cheiro fresco de horta regada. Mas o que avistávamos, da beira da enxerga, era um pinheiral cobrindo um cabeço e descendo pelo pendor suave, à maneira de uma hoste em marcha, com pinheiros na frente, destacados, direitos, emplumados de negro; mais longe as serras de além-rio, de uma fina e macia cor de violeta; depois a brancura do céu, todo liso, sem uma nuvem, de uma majestade divina. E lá de baixo, d os vales, subia, desgarrada e melancólica, uma voz de pegureiro cantando.

Jacinto caminhou lentamente para o poial de uma janela, onde caiu esbarrondado pelo desastre, sem resistência perante aquele brusco desaparecimento de toda a Civilização! Eu palpava a enxerga, dura e regelada como um granito de Inverno. E pensando nos luxuosos colchões de penas e molas, tão prodigamente encaixotados no 202, desafoguei também a minha indignação:

- Mas os caixotes, caramba?... Como sé perdem assim trinta e tantos caixotes enormes?...

Jacinto sacudiu amargamente os ombros: - Encalhados, por aí, algures, num barracão!.





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