Sacudiu então a mão de Jacinto que «era da sua roda» rebolou pela escadaria florida e nobre. O meu Príncipe, imóvel nos degraus, de face pendida, cofiava lentamente os fios pendidos do bigode. Depois, olhando para mim, como um ser saturado de tédio e em quem nenhum tédio novo pode caber:
- Já agora subamos, sim?
Parti então, com muita alegria, para a minha apetecida romagem às cidades da Europa.
Ia viajar!... Viajei. Trinta e quatro vezes, à, pressa, bufando, com todo o sangue na face, desfiz e refiz a mala. Onze vezes passei o dia, num vagão, envolto em poeirada e fumo, sufocado, a arquejar, a escorrer de suor, saltando em cada estação para sorver desesperadamente limonadas mornas que me escangalhavam a entranha. Catorze vezes subi derreadamente, atrás de um criado, a escadaria desconhecida de um hotel; e espalhei o olhar incerto por um quarto desconhecido; e estranhei uma cama desconhecida, donde me erguia, estremunhado, para pedir em línguas desconhecidas um café com leite que me sabia a fava, um banho de tina que me cheirava a lodo. Oito vezes travei bulhas abomináveis na rua com cocheiros que me espoliavam. Perdi uma chapeleira, quinze lenços, três ceroulas, e duas botas, uma branca, outra envernizada, ambas do pé direito. Em mais de trinta mesas redondas esperei tristonhamente que me chegasse o boeuf-à-la-mode, já frio, com molho coalhado - e que o copeiro me trouxesse a garrafa de Bordéus que eu provava e repelia com desditosa carantonha. Percorri, na fresca penumbra dos granitos e dos mármores, com pé respeitoso e abafado, vinte e nove catedrais. Trilhei molemente, com uma dor surda na nuca, em catorze museus, cento e quarenta salas revestidas até aos tetos de Cristos, heróis, santos, ninfas, princesas, batalhas, arquiteturas, verduras, nudezas, sombrias manchas de betume, tristezas das formas imóveis!.