William Wilson - Cap. 1: William Wilson Pág. 14 / 27

As cortinas que a cercavam estavam corridas; executando o meu plano, abri-as lentamente, mas a luz clara iluminou completamente o adormecido e simultaneamente o meu olhar deteve-se na sua fisionomia. Olhei; e imediatamente se apossou de mim um entorpecimento, uma sensação gélida. O coração palpitou-me, os joelhos vacilaram e todo o meu espírito foi acometido de um terror sem explicação mas, de qualquer modo, intolerável. Respirando a custo, baixei a lanterna de modo a aproximá-la mais do seu rosto. Seriam mesmo... seriam mesmo aqueles os traços de William Wilson? Vi, realmente, que eram os seus, mas estremeci como que atacado de sezões ao imaginar que o não fossem. Que havia afinal neles que me perturbasse de tal maneira? Observei-o, enquanto me acorria vertiginosamente ao cérebro uma multitude de pensamentos incoerentes. Não era aquele o seu aspecto - não era certamente aquele - na vivacidade que o caracterizava quando acordado. O mesmo nome! Os mesmos traços pessoais! O mesmo dia de chegada à escola! E depois à sua obstinada e inexplicável imitação do meu modo de andar, da minha voz, dos meus hábitos, das minhas maneiras!

Estaria realmente dentro das possibilidades humanas que aquilo que presentemente via fosse o simples resultado da prática habitual daquela imitação sarcástica? Aterrado e com um arrepio, apaguei a lanterna, saí silenciosamente do quarto e deixei imediatamente aquela casa, para não mais voltar.

Decorridos alguns meses, passados em casa na mais completa ociosidade, acabei por ir estudar para Eton. Aquele breve interregno tinha bastado para desvanecer a lembrança do ocorrido na escola do Dr. Bransby, ou pelo menos para operar uma sensível alteração na natureza da sensação com que o recordava. A realidade - e tragédia - do drama não existia já.





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