A Origem da Tragédia - Cap. 4: Capítulo 4 Pág. 23 / 164

Ou por meio da bebida narcotizante, que por todos os homens e povos primitivos é cantada em hinos, ou por ocasião do imenso aproximar da primavera, que atravessa toda a natureza cheia de alegria, acordam aquelas emoções dionisíacas, em cujo aumento desaparece o subjetivo sob completo esquecimento de si mesmo. Na Idade Média alemã também se dobravam, sob idêntica força dionisíaca, hordas sempre crescentes, cantando e dançando de lugar para lugar: nestes dançarinos de São João e São Vito reconhecemos os coros báquicos dos gregos, com sua pré-história na Ásia Menor, até Babilônia e aos Sakéos entusiastas . Existem homens que, por falta de experiência ou por estupidez, se afastam de tais aparecimentos como de “doenças populares”, ironizando-as ou as lamentando, no sentir da própria saúde: estes pobres não suspeitam de como se torna cadavérica e fantasmagórica esta sua saúde, quando por eles passa, tormentosa a vida ardente de entusiastas dionisíacos.

Sob a magia do dionisíaco não só se fecha novamente a aliança entre homem e homem; também a natureza estranha, inimiga ou subjugada, torna a celebrar sua festa de reconciliação com seu filho perdido, o homem. Espontaneamente oferece a terra as suas dádivas, e pacíficas se aproximam as feras das rochas e do deserto. O carro de Dionísio está coberto de flores e coroas; sob seu jugo marcham a pantera e o Tigre. Transformando-se o “Hino da alegria” de Beethoven numa pintura, e não se ficando atrás com a imaginação quando os milhões no pó se afundam; então é possível aproximar-se do Dionisíaco. Agora é o escravo homem livre, agora todas as cadeias fixas, inimigas se rompem que, pela penúria, pelo capricho ou pela “moda insolente” foram estabelecidas entre os seres humanos.





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