A Origem da Tragédia - Cap. 12: Capítulo 12 Pág. 70 / 164

Eis um pensamento acerbo que, pela dignidade concedida ao delito, contrasta singularmente com o mito semita do pecado de Adão, no qual foram considerados, como sendo a origem do mal: a curiosidade, o fingimento mentiroso, a sedução, a concupiscência, enfim uma quantidade de afetações principalmente femininas. Aquilo que distingue a representação ariana, é a opinião elevada do pecado ativo como a real virtude de Prometeu; com que se encontrou, ao mesmo tempo, o fundamento ético da tragédia pessimista como a justificativa do mal humano, quer dizer tanto da culpa humana quanto do sofrimento causado por ela. A desgraça na essência das cousas — a que o ariano contemplativo não dá outra interpretação — a contradição no coração do mundo se lhe manifesta como a mistura de mundos diversos, por exemplo um divino e um humano, dos quais cada um, individualmente, está com a razão, que, porém, isolado do outro, é obrigado a sofrer por sua individualidade. No impulso heroico do indivíduo isolado concernente ao geral, no intento de atravessar o limite da individualização, e de querer ser o ser uno do mundo, ele sofre em si mesmo a contradição primitiva que as cousas encerram, o que quer dizer que ele comete pecados e sofre. Assim sendo, entendem os arianos o delito como homem e os semitas o pecado como mulher, assim como também é cometido o delito-primitivo pelo homem, e o pecado-primitivo pela mulher. Ademais diz o coro das bruxas:

“Isto tão exato não podemos considerar,

Com passos mil a mulher o faz;

Mas, por mais que ela se possa apressar,

Com um só salto vai o homem atrás.





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