A Origem da Tragédia - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 82 / 164

Mesmo a figura mais clara ainda era dotada de uma cauda de cometa, que parecia assinalar o incerto, o não-iluminável. Lusco-fusco idêntico se estendeu por sobre a construção do drama, principalmente sobre a importância do coro. E quão duvidosa se lhe deparava a solução dos problemas éticos! Quão questionável o tratamento dos mitos! Quanto é irregular a distribuição de felicidade e desgraça! Até na linguagem da tragédia antiga havia muito de chocante, pelo menos enigmático; o principal era a pompa, que ele considerava exagerada para situações comuns, tropos e enormidades demasiadas para a simplicidade dos caracteres. Assim estava ele, meditando febrilmente, no teatro, e confessava que, como espectador, não entendia seus grandes predecessores. Se, porém, lhe valia a razão, como a raiz em si de todo o gozo e de todo o trabalho, então ele era obrigado a inquirir, olhando em redor, se ninguém opinava semelhantemente, e se não havia ninguém que confessasse também aquela incomensurabilidade. Mas a multidão, e os melhores dentre ela, tinha somente um sorriso desconfiado para ele; entretanto ninguém lhe sabia explicar porque, ao contrário de suas dúvidas e objeções, os grandes mestres permaneciam com a razão. E foi neste estado atormentado que ele encontrou o outro espectador que não entendia a tragédia, e que por isso não a considerava. Unindo-se com este, ousou principiar, partindo de seu isolamento, a luta ingente contra as obras artísticas de Ésquilo e Sófocles — não com escritos polêmicos, mas como poeta dramático que contrapunha sua ideia da tragédia à ideia que lhe foi transmitida.





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