Como poderia ele, em virtude de excessivo respeito por seu público, desprezar o seu público?
Eurípides sentia-se superior — e esta é a solução do enigma apresentado à multidão, — mas não a dois de seus espectadores; a multidão ele a levava ao palco, naqueles dois espectadores venerava os únicos juízes e mestres capazes de julgar toda a sua arte. Seguindo as indicações e as advertências destes, transmitia Eurípides todo o mundo de sentimentos, paixões e experiências — que até agora se apresentaram nas plateias como coro invisível em toda a representação festiva — às almas de seus heróis de palco; cedia a suas exigências quando procurava, para estes novos caracteres, a palavra nova e o som novo, em suas vozes, somente, ouvia os louvores justiceiros de sua obra, assim como o encorajador prenúncio da vitória quando se via condenado pelo julgamento de seu público.
Destes dois espectadores é um — o próprio Eurípides. Eurípides como pensador, não como poeta. Dele poder-se-ia dizer que a plenitude extraordinária de seu talento crítico, — e nisso ele se assemelha a Lessing — tinha, se não produzido, pelo menos continuamente fecundado, um impulso secundário produtivo e artístico. Com este dom, com toda a celeridade e clareza de seu pensamento crítico, ia Eurípides ao teatro, esforçando-se por reconhecer nas obras primas de seus grandes antecessores, como em quadros escurecidos, traço por traço e linha por linha. E aqui aconteceu o que não pôde ser inesperado para o iniciado nos segredos profundos da tragédia esquiléica; ele percebeu em cada traço e em cada linha algo de incomensurável, uma certeza enganadora e ao mesmo tempo uma profundidade enigmática, e, podemos dizer, uma interminabilidade do fundo.